ESTUDOS DO SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL ESTIMULAM NOVA ROTA TECNOLÓGICA PARA AGRICULTURA BRASILEIRA
Embora o uso de remineralizadores de solos seja uma técnica recente no Brasil e no mundo, pesquisadores da CPRM dedicam-se à temática dentro dos estudos de agrominerais. Desde 2013, a legislação brasileira passou a incluir os remineralizadores (pós de rocha) na categoria de fertilizantes agrícolas. Apesar de carecer de insumos para a produção de fertilizantes, técnica ainda é pouco difundida no Brasil e no mundo.
O DGM em Pauta desta quinta-feira (25) contou com a pesquisadora Alessandra Blaskowski, que abordou a temática dos agrominerais e remineralizadores como insumo agrícola para o Brasil, com ênfase nos trabalhos do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) sobre o assunto. Promovida virtualmente pela CPRM, a palestra ocorreu na sala de reuniões virtual da Divisão de Sensoriamento Remoto e Geofísica (DISEGE). Durante toda a exposição da geóloga, a quantidade de participantes foi de 75 pessoas, o máximo permitido pela plataforma. Entre os espectadores, estavam o diretor-presidente, Esteves Colnago, e o diretor de Geologia e Recursos Minerais, Marcio Remédio.
“O Brasil é um país de dimensões continentais com grande geodiversidade, o que proporciona uma vasta quantidade de rochas e minerais com potencial para uso como insumos agrícolas”, apontou a pesquisadora Blaskowski. Além de considerar a alta demanda brasileira por insumos, a intensa atividade mineral brasileira também é positiva para o uso dos agrominerais, já que a mineração gera enormes quantidades de material de descarte (minerais, rochas e pastas de tratamento de minérios), que também têm potencial para emprego agrícola, caso apresentem as características favoráveis à finalidade.
A possibilidade do uso de descartes de mineração na agricultura é uma forma de desenvolvimento dentro de uma perspectiva socioeconômica sustentável. “O Brasil tem na agricultura uma das mais importantes bases para sua economia e, por ser um país com grande vocação e produtividade agrícola, ao longo dos últimos anos, tem aumentado seu consumo e importação de insumos para produção de fertilizantes, além de amargar uma redução nos índices de produção interna desses insumos. Assim, é fundamental para o país ampliar suas pesquisas voltadas para insumos agrícolas, tanto para produção dos fertilizantes convencionais (NPK e outras formulações) como para fertilizantes alternativos”, afirmou.
Mesmo com as vantagens de redução do passivo ambiental e a possibilidade de aditar mais um produto economicamente explotável, o setor mineral ainda não despertou para a atividade. “É importante que o país caminhe por esta nova rota tecnológica. É fundamental que o Brasil tenha um olhar sábio para os agrominerais e invista em pesquisas do tipo”, apontou a geóloga. Hoje existem no país produtos certificados como
remineralizadores de solos pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) em Goiás, Minas Gerais, Paraná, São Paulo, Distrito Federal e recentemente na Bahia.
A pesquisadora explica que não é qualquer descarte mineral, no entanto, que pode ser usado como remineralizador. É necessário que o material apresente características que sigam a instrução normativa IN 05/2016 do MAPA. “Nas pesquisas feitas pela CPRM, foram observados diversos possíveis materiais para uso agrícola. Entretanto, ainda precisam passar por testes agronômicos em diferentes tipos de culturas e solos para confirmar a sua capacidade agrícola”, esclareceu.
Blaskowski estabeleceu as diferenças entre remineralização mineral e condicionamento/melhoramento dos solos. “Remineralização é o ato de adicionar macronutrientes e micronutrientes ao sistema solo-planta. Os macronutrientes — cálcio, magnésio, potássio, fósforo e enxofre — são elementos fundamentais para o desenvolvimento das plantas. Já os micronutrientes são elementos menores, que também são necessários na agricultura, embora em quantidades menores, e que podem ser subdivididos em essenciais — boro, cloro, cobre, ferro, manganês, molibdênio e zinco — e benéficos — sódio, cobalto, silício, níquel e selênio”, elencou a geóloga.
Já as técnicas de condicionamento e melhoramento utilizam elementos cujas características físicas e/ou químicas melhoram a capacidade agrícola do solo. Exemplos das práticas incluem a correção de pH, de condições estruturais e técnicas de proteção ou cobertura.
A legislação brasileira vem passando, nos últimos anos, por atualizações, a fim de atender o processo produtivo agrícola atual. Em 2013, a lei de fertilizantes (Lei Nº 12.980/2013) passou a incluir os remineralizadores de solos como uma categoria de insumo agrícola no Brasil. “Esta alteração da lei foi o primeiro passo na direção de uma legislação específica para possibilitar o uso de rochas como remineralizadores”, explicou Blaskowski. “Esse panorama se consolidou com a instrução normativa do MAPA, que passou a legislar sobre as especificações, garantias mínimas e tolerâncias para os produtos considerados remineralizadores de solos, estabelecendo, assim, os parâmetros e formas de apresentação comercial dos novos produtos”, continuou.
Segundo a geóloga, é essencial que as certificações e os processos de fiscalização ocorram com a agilidade necessária para atender às demandas do setor, com o risco de utilização de produtos não certificados, como já é o caso em algumas regiões. “O Brasil tem na agricultura uma das mais importantes bases para sua economia e, por ser um país com grande vocação e produtividade agrícola, também carece de insumos para a produção de fertilizantes”. ESTUDOS DA CPRM — A CPRM tem dois projetos de remineralização: Projeto Irecê Jaguarari, já concluído, e
Projeto Avaliação do Potencial Agromineral do Brasil, ainda em andamento. O Projeto Irecê Jaguarari foi piloto no assunto, desenvolvido em parceria com a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco (Codevasf).
De acordo com Blaskowski, o Projeto resultou na proposição de fontes de potássio, como os flogopititos dos descartes dos garimpos de esmeralda (Cooperativa Mineral da Bahia, municípios de Campo Formoso e Pindobaçú); fósforo (bacia de rejeitos da Mineradora Galvani, município de Irecê); cálcio, magnésio e corretivos de solos (rochas da Bacia de Irecê); magnésio, sílica e corretivos de solos associados a rochas máficas e ultramáficas das lavras de cromita da Mineração Ferbasa-Cia de Ferro Ligas da Bahia (Campo Formoso e Andorinhas); kimberlitos da Lipari Mineração Ltda (Campo Kimberlítico de Nordestina) e fontes de multinutrientes e micronutrientes variados (bacia de rejeitos da mineradora Caraíba S/A, Jaguarari), sendo que para cada uma delas foram efetuadas considerações quanto à viabilidade de uso, reservas, logística e fatores restritivos.
O Projeto Avaliação do Potencial Agromineral do Brasil, por sua vez, foi iniciado em 2019 e ainda está em andamento, com pesquisas nas áreas de Tocantins e Roraima e Amazonas, com previsão de iniciar trabalhos também em Goiás. O projeto já identificou materiais como fontes de macronutrientes e micronutrientes disponíveis em pilhas de descartes de mineração e garimpos.
Além das pesquisas dos projetos da CPRM, há um grupo interno que atua no Grupo de Trabalho Interministerial para divulgação e desenvolvimento do tema no Brasil. “Nesse grupo de profissionais, destaco as pesquisadoras Magda Bergman e Andrea Sander, que têm trabalhado com empenho no tema, com a publicação de trabalhos diversos, além de participação e organização de eventos, como o IV Congresso Brasileiro de Rochagem (previsto para março 2021).”
Também é importante destacar que, em 2018, um grupo de 18 pesquisadores da CPRM participaram do curso de agrogeologia com um dos maiores entusiastas das pesquisas para a utilização de pós de rocha na remineralização e condicionamento de solos no mundo. O pesquisador canadense Prof. Dr Peter Van Straaten, que vem desenvolvendo estudos com esta finalidade em diversas regiões do mundo, como no leste e no sul da África, na Ásia e na América do Sul e Brasil. “O Brasil é pioneiro na temática, pois, além de ter legislação específica para esse tipo de produto no MAPA, conta com instituições governamentais, como a CPRM e EMBRAPA, que vêm desenvolvendo pesquisas voltadas para essa nova categoria de insumo agrícola”, destacou Blaskowski.
NOVOS DESAFIOS — Por fim, Blaskowski ressaltou que os agrominerais são uma alternativa viável e ambientalmente inteligente. “É fundamental que o país tenha mais investimento nesse tipo de pesquisa, além de
promover políticas públicas que incentivem o uso dos remineralizadores de solos tanto na agricultura familiar como no agronegócio”, opinou.
A geóloga recomendou a continuidade de estudos, com a realização de testes agrícolas, a fim de garantir a capacidade agrícola dos materiais, testando possibilidades de misturas e adequando-os aos diferentes solos e cultivos. “Os próximos passos das pesquisas devem propor novas áreas, buscando locais em que seja possível identificar e associar as demandas das culturas agrícolas regionais com fontes minerais próximas, além de considerar os arranjos produtivos que viabilizem a prática da rochagem”, observou.
Para Blaskowski, o foco dos projetos — que devem ser distribuídos em todo o território nacional — deve ser as regiões agrícolas, já que os remineralizadores de solos são insumos usados em grandes quantidades (da ordem de várias toneladas por hectare) e têm de ser, necessariamente, de fontes locais. “É gratificante trabalhar em uma área em que o retorno para sociedade é notável. Durante nossas pesquisas, podemos observar a necessidade de reformulação da exploração mineral, para considerar, desde o início do projeto, a possibilidade do uso de rejeitos, buscando uma forma mais inteligente de exploração mineral”, concluiu a geóloga.
A PESQUISADORA — Alessandra Blaskowski é graduada em Geologia pela Universidade Federal do Paraná — UFPR (2007) e mestre em geociências pela Universidade Federal da Bahia — UFBA (2018), com dissertação intitulada “Caracterização Petrológica e Química das Rochas de Rejeito da Mina Ipueira e seu Potencial Agromineral”. Desde 2010 atua como pesquisadora em geociências no Serviço Geológico do Brasil, na Superintendência Regional de Salvador, onde já chefiou projetos na área de exploração mineral. Tem experiência na área de pesquisa mineral, sondagem diamantada – acompanhamento, locação de furos, descrição de testemunhos, pesquisas minerais com check de anomalias. Trabalhou no projeto “Fosfato Brasil”, “Metalogenia da Província Plumbo-Zincífera da Bacia de Utinga – Nova Redenção, Bahia”, e chefiou os projetos “Calcários da Bahia: Tipologia e Aplicações Industriais” e “Agrominerais da Região de Irecê e Jaguarari, Bahia”. Atualmente, coordena o Projeto “Avaliaçao do Potencial Agromineral do Brasil” que visa o mapeamento e prospecção de rochas e materiais que tenham potencial como remineralizadores e condicionadores de solos. Atua em pesquisas na área de petrologia, geoquímica, agrominerais e exploração mineral.
Fonte: CPRM/ADIMB