OLHE À SUA VOLTA, HÁ UM GEÓLOGO POR AÍ
"Só uns poucos tomam, por todos os demais, o encargo nobre e pleno da responsabilidade de
custodiar a escritura sagrada da Terra, de lê-la e interpretá-la, pois o enlace consciente do
homem com sua estrela está confiado a uma ciência em especial, a GEOLOGIA".
Hans Closs-(1885- 1951)
No dia 30 de maio comemora-se internacionalmente o Dia do Geólogo. Diferentemente
de vários países do mundo, onde a atividade profissional do Geólogo é já entendida em sua
enorme importância para o Homem, tem sido regra em nosso país que esse dia passe
praticamente despercebido pela sociedade, reflexo do ainda precário conhecimento que esta
sociedade tem sobre a atividade de seus geólogos. Diga-se a bem da verdade que esse relativo
desconhecimento deve-se em boa parte aos próprios geólogos, em geral mais afeitos a seus
círculos profissionais específicos e restritos e despreocupados em dialogar mais abertamente com
a sociedade sobre as importantíssimas questões com que trabalha.
Simplificadamente, podemos dividir em três grandes planos a atividade profissional do
Geólogo, todos eles, como se verá, com estreita relação com o cotidiano e com a qualidade da
vida humana no planeta:
Geologia do Planeta, no âmbito do qual o Geólogo estuda e investiga a história, a
composição e o desenvolvimento geológico do planeta, trazendo informações essenciais para a
boa condução das relações do Homem com a Terra, seja no que esta lhe fornece de insumos
necessários à sua vida, seja nos cuidados que devam ser adotados e cumpridos para que as
condições essenciais à vida não sejam colocadas em risco. Dentro desse quadro dedica-se
atenção especial aos fenômenos associados às dinâmicas geológicas planetárias interna e externa,
como a evolução geológica das paisagens, terremotos, maremotos, tsunamis, vulcanismos,
variações do nível dos oceanos, sucessão de variações climáticas globais, processos regionais de
desertificação, erosivos, deslizamentos e avalanches naturais, etc.
Essencial por fim destacar a atividade dos geólogos em Ensino e Pesquisa, especialmente no
âmbito das Universidades e Centros de Pesquisa. A esses colegas devemos o preparo constante
de novos profissionais, as novas descobertas e os aprofundamentos dos conhecimentos que
sempre alimentarão a base de informações utilizadas nas atividades aplicadas da Geologia.
Exploração de Recursos Minerais, plano em que o Geólogo estuda a formação de
jazidas minerais de interesse do Homem (ferro, manganês, cobre, carvão mineral, petróleo, água
subterrânea, urânio, alumínio, areia e brita para construção, argila para cerâmica, etc., etc.),
localiza-as na Natureza, avalia-as técnica e economicamente e planeja, juntamente com o
Engenheiro de Minas, sua lavra e a posterior recuperação ambiental da área afetada;
Geologia de Engenharia, dentro do qual o Geólogo estuda as interações recíprocas entre
o Homem e o meio físico geológico, aqui incluindo as questões ambientais. Dentro desse plano é
importante entender que, para o atendimento de suas necessidades (energia, transporte,
alimentação, moradia, segurança física, saúde, comunicação…), o Homem é inexoravelmente
levado a ocupar e modificar espaços naturais das mais diversas formas (cidades, agricultura,
indústria, usinas elétricas, estradas, portos, canais, extração de minérios, disposição de rejeitos
ou resíduos industriais e urbanos…), o que já o transformou no mais poderoso agente geológico
hoje atuante na superfície do planeta. Pois bem, caso esses empreendimentos não levem em
conta, desde seu projeto até sua implantação e operação, as características dos materiais e dos
processos geológicos naturais com que vão interferir e interagir, é quase certo que a Natureza
responda através de acidentes locais (o rompimento de uma barragem, o colapso de uma ponte, a
ruptura de um talude, por exemplo), ou graves problemas regionais (o assoreamento de um rio,
de um reservatório, de um porto, as enchentes e escorregamentos, a contaminação de solos e de
águas superficiais e subterrâneas, por exemplo), conseqüências todas extremamente onerosas
social e financeiramente, e muitas vezes trágicas no que diz respeito à perda de vidas humanas.
Enfim, mesmo com a abdicação do consumismo tresloucado e do crescimento
populacional descontrolado, a epopéia civilizatória de chegarmos a uma sociedade onde todos os
seres humanos tenham uma vida materialmente digna e espiritualmente plena, exigirá, sem
dúvida, a multiplicação de empreendimentos humanos no planeta: exploração mineral, energia,
transportes, indústrias, cidades, agricultura, disposição de resíduos… A Geologia é uma das
ciências sobre as quais recai a enorme responsabilidade de tornar essa maravilhosa utopia técnica
e ambientalmente possível, sem que a própria possibilidade da vida humana no planeta seja
comprometida.
Conclui-se, assim, que para se assegurar que a Humanidade tenha um futuro promissor e
pleno de felicidade em seu planeta faz-se cada vez mais imprescindível conversar com a Terra.
Para esse diálogo, os homens têm seu inspirado intérprete: o Geólogo.
Cabe ainda lembrar outros campos de aplicação da Geologia, como a Espeleologia, a
Arqueologia, a Medicina, a Geologia Espacial, entre outros.
De outra parte, a Geologia é uma geociência maravilhosa. E seu caráter maravilhoso liga-
se à sua intrínseca relação com o movimento (Movimento = Matéria + Tempo + Espaço). O
sentido maior da Geologia é apreender o movimento, os processos que definiram, definem e
definirão o Planeta e seus fenômenos. O fator Tempo pode ser também importante em outras
profissões, mas na Geologia é a variável permanente e onipresente em todas suas equações.
Dentro desse espírito, é justo rendermos um tributo ao Geólogo escocês James
Hutton, que ao final do séc. XVIII, pela primeira vez rompeu documentada e corajosamente com
os estreitos tabus e dogmas religiosos da época, para os quais o mundo atual era exatamente
aquele criado por Deus, cunhando então (o geólogo britânico, Charles Lyell, logo em seguida
deu primorosa e enérgica seqüência à sua teoria) as bases da teoria do Uniformitarismo ("o
Presente é a chave do Passado"); a qual, por sinal, Darwin, dando todos os créditos a Lyell e
Hutton, aplicou ao mundo Biológico. Dizia Hutton: "Desde o topo da montanha à praia do
mar…tudo está em estado de mudança. Por meio da erosão a superfície da Terra deteriora-se
localmente, mas por processos de formação das rochas ela se reconstrói em outra parte. A
Terra possui um estado de crescimento e aumento; ela tem um outro estado, que é o de
diminuição e degeneração. Este mundo é, assim, destruído em uma parte, mas renovado em
outra".
Ao Geólogo, portanto, com todo o merecimento, cabem as honras e homenagem por mais
esse aniversário de sua tão bela profissão.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas
Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da
Serra do Mar”, “Diálogos Geológicos”, “Cubatão”, “Enchentes e Deslizamentos: Causas e
Soluções”, “Manual Básico para Elaboração e Uso da Carta Geotécnica”, “Cidades e Geologia”
Consultor em Geologia de Engenharia e Geotecnia
O GEÓLOGO
Álvaro mar 2015
Tira-lhe seus mapas
E logo outros estará a imaginar,
Tira-lhe o Norte
Sobrar-lhe-ão os ventos,
O sol, as estrelas e o mar,
Tira-lhe seu martelo,
Companheiro inseparável,
Uma lasca, ao fim, o acalma,
Mas tira-lhe o campo
E matará sua alma.